Tiradentes é um dos ícones da cozinha mineira e tem na gastronomia a marca de sua identidade

Elaborado por:

Geórgia Caetano – jornalista, com a colaboração dos alunos
Glayber Soares Diniz e Thatiane do Vale Coutinho

Impossível definir a alma das Gerais sem falar da arte culinária, esse caldeirão cultural que atravessa fronteiras, atrai visitantes e se tornou marca registrada da mineiridade. Em Minas Gerais, o município de Tiradentes é um dos primeiros destinos lembrados quando se fala em gastronomia. A cidade histórica é conhecida por sua diversidade de restaurantes com oferta de pratos que agradam a todos os paladares e também é sede de um dos principais eventos gastronômicos do país, o Festival Cultura e Gastronomia de Tiradentes.

Para conhecer um pouco dessa renomada cozinha, alunos do Projeto de Extensão do curso de Gastronomia da Faculdade Senac Minas fizeram um levantamento, no primeiro semestre de 2021, que ouviu moradores, chefes, empresários e autoridades da pequena cidade histórica e conheceram um pouco da relação do município mineiro com o seu principal ícone – a comida.

Produtos locais

Em Tiradentes, a produção do alimento segue fiel à tradição da cozinha mineira. Alguns pratos muito característicos dos fogões à lenha do interior do estado podem ser facilmente encontrados nos mais variados restaurantes da cidade. Entre essas delícias, estão o tutu com torresmo, o feijão tropeiro, o angu com quiabo, a canjiquinha com carne, a costela e o lombo de porco. Tem também aqueles quitutes variados produzidos à base de milho como o bambá de couve (milho com couve e carne de porco).

“O frango caipira é muito utilizado na gastronomia da cidade histórica. Ele é apresentado em diversas versões como ao molho pardo, ou com quiabo, com ora-pro-nóbis, ou simplesmente com caldinho, sempre muito bem temperado com as especiarias diversas. Quanto às sobremesas, há fartura de doces e compotas: doce de leite, arroz doce, doce de laranja da terra, de laranja cidreira, rocambole recheado, figo em calda e cristalizado, ambrosia, geleias diversas. Todas essas delícias formam uma dupla perfeita quando saboreados com o famoso queijo Minas”, destaca Maria Aparecida do Nascimento, natural de Tiradentes e funcionária do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Produtos bem típicos de Tiradentes, como queijos, biscoitos e geleias vêm das comunidades situadas na zona rural do município, como a Estrada da Caixa D’Água e a comunidade Boa Esperança. Nesses lugarejos é possível comprar nas próprias casinhas dos moradores ou no mercadinho comunitário os produtos artesanais da região. Esses lugares estão inseridos em uma rota de pequenos produtores da agricultura familiar, que abastecem os restaurantes locais e contribuem para a diversidade de produtos e sabores que encantam tanto os moradores quanto os mais exigentes turistas.

Os restaurantes da cidade tornaram-se vitrine da gastronomia mineira pela variedade dos ingredientes, sempre frescos e saborosos, enaltecendo a tradição das cozinhas de Minas. Segundo o chefe e empresário do ramo da gastronomia, Luiz César Costa, os restaurantes de Tiradentes se beneficiam da variedade de produtos locais para o preparo de seus pratos, inclusive para aqueles mais requintados. “A maioria das coisas que a gente usa é daqui de Tiradentes. Se precisamos do queijo, buscamos na Estrada da Caixa D’água, a manteiga tem ali na casa da senhorinha que a produz e comercializa, o ora-pro-nóbis eu pego no pé da Serra de São José. Todos os produtos que usamos são locais, daqui da região”, destaca o empresário. 

Luiz possui um restaurante na cidade, que ele denomina como uma fusão italiana, francesa e mineira e, por meio dos produtos locais, ele diversifica e constrói suas receitas. “Se no mercado está difícil o arroz para a elaboração do risoto, eu busco um insumo local e utilizo – a canjiquinha – em substituição ao arroz italiano. Vamos inovando para vender esta paixão que a gente tem, que é a gastronomia”, ressalta.

Por sua diversidade de produtos, a culinária de Tiradentes permanece, durante séculos, trazendo novidades, surpreendendo iniciados e iniciantes na arte da gastronomia. “Há sempre muitos sabores a descobrir em novos usos para antigos ingredientes e nas velhas receitas reinterpretadas, define a moradora Maria Aparecida.

Ora-pro-nóbis é um dos destaques

Ora-pro-nóbis é identificado como um dos principais produtos da gastronomia do lugar e reforça a identidade dos moradores. A verdura ganha espaço na criação de grandes chefes e encanta todos os paladares. O ingrediente possui sabor suave e textura única, combina com carnes e risotos, por exemplo.

O chefe Luiz Costa destaca que o ingrediente é uma referência na cozinha dos moradores da cidade. “Eu gosto muito de usar o ora-pro-nóbis, tanto em meu restaurante como em casa. A gente costuma pôr o ora-pro-nóbis no forno, socar e depois misturar no meio do feijão. É um produto muito rico em vitaminas”. O empresário destaca ainda que a comida tridentina é uma mistura de muitos ingredientes. “Um dia preparamos um anguzinho, outro dia fazemos uma couve e tal, mas eu acho que o ora-pro-nóbis é uma referência de Tiradentes.”

O ex-prefeito da cidade, Ralph Justino, concorda que o ora-pro-nóbis é um destaque na produção da gastronomia da cidade. “Não são todas as regiões de Minas Gerais que têm o frango com ora-pro-nóbis que a gente tem. Por aqui, a gente produz alimentos variados, alguns feitos da carne do porco, como o torresmo, e outros como o próprio pão de queijo, comidas bem mineiras mesmo. Mas, o frango com ora-pro-nóbis talvez seja o nosso prato mais típico “, enfatiza Justino.

Já a turismóloga e empresária do ramo gastronômico, Fernanda Fonseca, destaca que junto ao ora-pro-nóbis outros produtos são importantes para a cidade e já conquistaram o gosto dos turistas, como o frango ao molho pardo, o tutu de feijão e o feijão tropeiro. “São produtos muito típicos, fazem parte da identidade da cidade. Estão no dia a dia dos moradores e viraram importantes atrativos turísticos. As pessoas que procuram restaurantes de comida típica, procuram por estes pratos”, define a moradora.

Identidade e sentimento de pertencimento

Tiradentes é motivo de orgulho para os moradores, nascidos no lugar, assim como para aqueles que escolheram o destino para construir um lar. “A partir do momento em que você toma a decisão e vem para Tiradentes, já começa a se apaixonar. Além da cidade ser linda, possui a serra de São José, o casario colonial e as pessoas começam a sentir um algo a mais que é inexplicável. É por isso que muita gente vem pra cá, passa um período de descanso, e acaba se apaixonando e ficando”, é o que diz o empresário Luiz Costa.

O ex-prefeito da cidade, Ralph Justino, compartilha do mesmo sentimento. Natural do Rio de Janeiro, já morou em grandes cidades nacionais e do exterior, mas foi Tiradentes que ele escolheu para viver. “Ter vindo para Tiradentes faz parte do sonho que o brasileiro tem de morar em uma cidadezinha do interior. Quando cheguei aqui, Tiradentes nem era tão conhecida, então, hoje, eu tenho uma relação muito grande com a cidade”, destacou.

Natural de Tiradentes, a turismóloga Fernanda Fonseca se orgulha de fazer parte de uma família que habita a cidade há mais de 200 anos.  A história da turismóloga é um exemplo da miscigenação do povo brasileiro. O seu tataravô italiano casou-se com uma ex-escrava e a família foi se formando ao longo dos anos.  “Tiradentes é muito do que eu sou.  Ser de Tiradentes faz parte da minha identidade, da minha criação, da minha formação”, orgulha-se Fonseca.

Sugestão de Box

Para completar o trabalho de pesquisa na cidade histórica, os alunos do curso de gastronomia da Faculdade Senac Minas buscaram uma receita bem típica, que traduz o modo de produção do tradicional frango com ora-pro-nóbis, elaborado há centenas de anos em Minas Gerais.

Frango com ora-pro-nóbis

1 un. frango inteiro cortado em pedaços

100 g cebola repicada

3 xícaras de folhas de ora-pro-nóbis

5 un. dente de alho repicado

1 colher de sopa colorau

2 un. ramo de salsinha repicada

3 un. ramo de cebolinha repicada

2 un. folha de louro

50 ml óleo de cozinha

q.b. sal

q.b. água

Modo de preparo:

1) Tempere o frango com sal ou com pasta de alho e sal.

2) Numa panela de fundo grosso, aqueça o óleo e doure bem os pedaços de frango, por todos os lados, sem deixar queimar.

3) Adicione o colorau, a cebola e continue dourando bem. Em seguida, acrescente o alho.

4) Acrescente água até cobrir o todo o frango. Acrescente o louro e uma boa pitada de sal.

5) Cozinhe em fogo médio, com a panela tampada, até que fique bem macio.

6) Quando o frango já estiver macio, acrescente o ora-pro-nóbis. Mexa para incorporar e desligue o fogo.

6) Finalize com a salsinha e a cebolinha, ajuste o tempero e sirva.

 * q.b. = quanto basta, ou a gosto.

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